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quarta-feira, 6 de abril de 2011

Pais e filhos. Para pensar.

Deputado Bolsonaro

O assunto tomou conta da web nesta semana. Como vocês já devem ter lido o Deputado Bolsonaro foi no programa CQC , da Rede Bandeirantes, na última segunda-feira , onde deu uma polêmica entrevista. Ele respondeu a perguntas do público e falou sem rodeios de questões como ditadura, drogas, racismo e homossexualidade. Dentre as barbaridades que falou o deputado  disse que "daria umas porradas" no filho se o pegasse fumando maconha, e que nunca correu o risco de ter um filho gay porque sempre foi um pai "presente" e que deu uma "boa educação". O assunto é mais sério do que possa parecer. Olhar apenas e dizer que é coisa de maluco que quer aparecer é perder a oportunidade para aprender. De tudo que tenho lido a respeito, a resenha do Reinaldo Azevedo ( o melhor colunista de política e costumes do Brasil) é para mim a mais inteligente. A que ele escreveu hoje em seu blog é fantástica e resolvi dividi-la com vocês. Transcrevo abaixo, o link completo aqui
Pais e filhos 
Defendo o direito de Bolsonaro dizer o que diz, mas é claro que algumas de suas opiniões me incomodam: são desinformadas, canhestras, até cruéis. De todas, a mais cretina, a que convoca para o embate  é a sua certeza de que não há gays em famílias estruturadas. Nem é preciso recorrer à ciência ou à história para provar que ele está errado. Basta o empirismo mais chão:  quantos de nós não conhecemos homossexuais cujos irmãos são heterossexuais, todos criados sob o mesmo teto, na mesma esfera de amor ou desamor? É até possível que a maioria dos pais e mães de gays preferisse um filho heterossexual; alguns tantos em razão do preconceito; a maioria, quero crer, porque sabe que os filhos encontrarão dificuldades adicionais. E isso certamente gera preocupação, dor, apreensão. O juiz Bolsonaro, com toda a sua carga de desinformação, ligeireza e indelicadeza, aponta-lhes o dedo e diz: “Vocês são os culpados!” Não! Eles não são! Não há culpas a apurar.
Desde que sou pai, há algo além do prazer e, às vezes, do sofrimento de ser quem sou: as minhas filhas! Conheci o amor incondicional, não sem certa dor durante um tempo: enquanto esperávamos a segunda, perdia o sono porque temia não conseguir dividir com a mais nova aquele amor que descobrira. Vão me dizer piegas, eu sei, mas não me importo. Eu tinha errado de operação: nessas coisas, o amor não se divide; multiplica-se o imensurável. Sejam elas o que forem em sua vida afetiva, o fato é que serão o que são e o que sempre foram. Bolsonaro deveria falar menos e estudar mais. Sugerir que se dêem uns petelecos no “filho gayzinho” ofende a minha condição de pai. Um garoto ou uma garota nessa condição estará certamente sofrendo, lutando contra os próprios sentimentos, contra um ordenamento do mundo que, com efeito, lhe é hostil porque a maioria esmagadora é outra coisa. Ele sugere uns tapas. Eu sugiro um abraço.
Lastimo a sua pantomima ao tratar de assunto tão sério, dando asas àqueles que usam a sua pregação estúpida para flertar com leis autoritárias. Nesses 16 anos em que sou pai, o meu amor mais se exacerbou não quando elas exibiram vitórias, conquistas, quando foram bem-sucedidas, quando brilharam, quando tive a chance, em suma, de exibi-las à família e aos amigos: “Vejam como são inteligentes, bonitas, interessantes…” Meu afeto mais se extremou foi no insucesso, na derrota, no sofrimento, na contrariedade. Não sou como Bolsonaro; não dou receitas. Eu sugiro apenas: amem os seus filhos como são — e tentem lhes ensinar tudo aquilo que eles podem aprender — porque o amor, com efeito, também sabe ser severo. E a gente se torna aquilo que a gente é mais o que a gente aprende.
Não trato sem certa graça algumas mentes apocalípticas, certas de que alguém pode “decidir” ser gay e que, no caso, o ambiente tem um peso definitivo nessa “escolha”. Pergunta: eles próprios, então, não são gays porque escolheram não ser, mas poderiam,  pressionados pelo meio, mudar de orientação, é isso? Tanta gritaria poderia ser interpretada como medo de cair em tentação? Assim, quanto mais distantes ficassem os “degenerados”, mais protegidos se sentiriam? Entendo que um homossexual não se tonará hétero entre héteros — e também não me parece que possa acontecer o contrário. Qual é a tese? Todo mundo teria em si um gay reprimido pelas leis e pelos costumes, à espera de uma boa oportunidade? O próprio Bolsonaro, então, não é um deles porque, segundo a sua teoria, seu pai foi devidamente severo, mantendo-o longe de ambientes “promíscuos”? Numa outra circunstância, com uma família mais relaxada, o mundo teria assistido ao  desabrochar de uma Madame Satã de olhos azuis? Cuidado, deputado! Nem o senhor está livre da lógica. Se o meio faz o gay, então há um gay enrustido em cada indivíduo à espera do meio. Nem o gayzismo mais sectário defenderia tese tão delirante
O meio em que vivemos interfere, sim, em certas escolhas que fazemos, embora não determine a nossa vida de maneira nenhuma. Sigo a máxima de que pouco importa o que fizeram de nós, mas sim aquilo que fazemos do que fizeram de nós. Eu acredito na vontade, mas a sexualidade não está entre as questões que podem ser reguladas por ela, ainda que alguns lunáticos, manipulando teorias de quinta categoria e achismos, defendam “terapias” de correção de comportamento ou coisa parecida. Outros, ainda, apelam à religião. Que sejam livres para defender as suas teses, assim como sou para criticá-las.
Sou um pai, acho, bastante severo. Acredito, já disse, em disciplina e hierarquia. Mas o amor que está em mim me obriga a tentar ajudar as minhas filhas a serem felizes com os recursos e aptidões que têm, sendo quem são. Não me comporto, elas sabem disso, como um de seus amigos. Trata-se de esferas diferentes de afeto. Eles não podem lhes dizer certos “nãos” que eu digo porque sinto ser a minha obrigação — às vezes, é o que os filhos  esperam de nós; o “não” até os pacifica. Mas, por Deus!, se estiverem sofrendo, eu quero ser o amparo generoso. Estão além do meu prazer e da minha dor; além, inclusive, do que sonhei pra elas. Porque ninguém sonha a vida do outro. E um filho somos nós mesmos que nos fizemos um outro!
Por isso morremos.
Por isso viveremos para sempre! 
Por Reinaldo Azevedo

Perfeito, disse tudo. As vezes acho que estamos dando muito palco para esse deputado e suas ideias. Não fosse a intenção de certo grupo de querer calá-lo, o melhor seria deixá-lo falando com as paredes. Pior do que o que ele diz só pretender tirar o direito dele não falar. "...quero ser o amparo generoso...filho somos nós mesmos que nos fizemos um outro.". lindo um pai se ver assim e querer ser isso para os filhos. Tomará que eu possa ser.